segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Fascinante homem

Aproxima-se o natal. E na correria dos encontrões nas compras, no corre corre dos comes e bebes, dos presentes dados e recebidos, dos panetones que vão , e que vem, dos vinhos, dos..., esquecemo-nos do aniversariante. Afinal, cadê o parabens a você, cade o pic-pic, nao, não há parabens, nem vivas, nem ra thim bum. Nada. Mas temos corre corres, brindes e confraternizaçoes. Nesta data eu me lembro de uma pessoa simples, que se foi há algum tempo atraz. Deixo de ser o imperfeito filho para tentar ser o escriba inacabado; deixo que o coraçao fale mais puro e lembro com saudade, com respeito, com o sentimento do espaço vazio, de um fascinante homem que me ensinou o que é ser um filho, um pai e agora, no caminhar incessante da vida, um avô. Não há sentimentalismo, só sentimento e agora no se aproximar de um novo natal, reverencio aquele que foi na magnetude do nome, na simplicidade do gesto e na certeza do caminho, simplesmente ( por nao saber eu dizer mais, meu pai. Feliz Natal, pai, junto com o Aniversariante. Intercede, com seu jeito simples, por nós. Fascinante homem, aquele Fascinante homem, este suas mãos rudes aram a terra e, mágicas, servem o alimento, pronto na mesa. O que para tantos é um feito inimaginável para ele é um sonho simples, previsto e realizado encantando com sua multiplicidade de ofícios, e os artifícios que brotam simples, da escola vibrante da sua cabeça e da sua visão Fascinante homem, este Seus passos vão tão céleres no caminho traçado que são precisos sempre dois dos meus para acompanhar só um dos dele, faz do complicado o mais singelo, do obscuro, o mais visível, do inatingível, o mais tocado, do mais ausente, o eterno presente Fascinante homem, este Subiu e caiu varias vezes, não foram poucas, foram tantas, caiu, mas se levantou sucumbiu ? Claro que não, e se mais uma vez caiu e sempre há uma vez mais a cair e a subir, a padecer e reviver, ele se manteve de pé Não há esmero em ser rico pois essa companhia não lhe apetece e o desapego ao material, que sempre ínfimo lhe parece. é a marca de sua missão que não renegou jamais como rumo de vida, como a própria inabalável profissão da fé Fascinante homem este Uma longa estrada na cultura, outra muralha em fortaleza, Um lago sereno em candura, outra tempestade na franqueza, Um olhar firme, apenas, na reprimenda, Um outro tenro, no afago e no perdão Ah! Mas escriba errante, erraste no tempo os verbos não são mais o presente mas ditam o passado que jamais gostarias de ter escrito um dia e da forma que o fizestes escriba demente, sonhastes tão acordado que da passagem das horas, do transformar dos dias, não te apercebestes deste eterno presente agora um tanto mudado Mas ficas feliz, pois te mostro o lugar que a ele foi reservado: tão bom, tão sereno e tão elevado que vai extinguir a tua dor de viver sem aquele fascinante homem que não está mais visível, a teu lado.

quarta-feira, 2 de julho de 2008

NO PRINCIÍPIO ERA O VERSO

Ele chegava sempre mais cedo naquelas noites. Barba bem feita, cavanhaque escanhoado, sempre com profundas olheiras, demonstrando noites insones e dias mal trabalhados. Mas vinha contente, feliz, esperançoso. Parava na soleira da porta e soltava sua saudação especial: “Que os deuses do Olimpo olhem por vocês”.

Ela chegava sempre na hora certa, todas as noites. Cabelo arrumado, vestido impecável e, sempre com o imenso sorriso espalhando harmonia e felicidade. Vinha sempre contente, alegre, bonita, ocupava sua mesa especial e nos brindava com sua saudação natural: “Boa noite a todos vocês”.

Todos se acomodavam para cinqüenta minutos da mais pura literatura. Naquela torrente de mensagens virávamos reis, poetas, musas e rainhas. O turbilhão lá fora não mais existia, apenas e tão somente palavras jogadas ao ar e levadas pela emoção.

Ela se enamorara da literatura, ele se apaixonara pela professora. Ela o via como o mais esforçado dos alunos, ela a imaginava como a mais importante das musas. Ela o considerava o melhor, ele a considerava a única.

Ele era o verso imperfeito, ela a literatura mais apurada. Juntos faziam os versos mais eloqüentes, ela rimava sua poesia com alegria, ele se torturava em amor e dor. Ela encerrava a aula com a certeza do dever cumprido, ele a recomeçava perambulando pelas madrugadas, estendendo a aula imaginária num amor impossível.

Ele era regato límpido e manso, ela a tormenta avassaladora. Ela umedecia as margens e gerava vida, ele rompia barreiras, inundava, matava, morria.

Tantas e tantas vezes ela o afastara com respeito e carinho, tantas e tantas vezes ele retornava com seu sonho inimaginável. Não havia outro sentimento nela que não fosse espalhar a literatura, o que mais gostava; não se sentia nele outro argumento que não fosse reviver seu amor impensável, o que lhe impulsionava a viver. Seus deuses do Olimpo estavam alheios ao seu sofrimento. Seus deuses do Olimpo estavam olhando para o outro lado. Mas ele não desistia, cada vez mais se esforçava em demonstrar o desejo imenso de romper os limites da aula e do razoável; cada vez mais ela se esmerava em estabelecer os padrões normais que deveriam guiar uma professora e um aluno.

Mas a literatura falava mais forte, e ela continuava a vê-lo como o melhor de todos, ele a via, cada vez mais, desgraçadamente, como a única a preencher os vazios que todos os instantes do dia lhe proporcionavam. Ela vibrava com a poesia, ele delirava, ela se soltava para a classe. Ele renascia só para ela.

E, no entanto, nunca tiveram outro relacionamento que não fosse o de professora e aluno.

Um dia, ou uma noite, sei lá, o esperado se fez presente.

Naquele instante, o inatingível dedo do destino comprimiu a arma do desatino e ele se foi.

No silencio daquele momento todos os poetas desfilaram para nó e sentimos forte a presença dela, triste, quieta, agente involuntária e inocente de um verso mal acabado, de um poema interrompido.

Faltava a rima final, a métrica se perdeu na irresponsabilidade de um sonho inútil. Dali em diante as aulas perderam o significado, já não enfeitiçavam mais, terminamos o ano, encerramos o ciclo, acabou.

Se foi insensato seu comportamento não me cabe julgar. Sei apenas que um amigo se misturou com as estrelas e hoje deve passear entre elas no sonho de uma vida cósmica que a efemeridade do espaço terreno não pode ofuscar.

Varias décadas se passaram, e toda vez que piso naquela calçada,dentre tantos amigos que lá deixei, lembro dos dois.

Aquele sobrado, no comecinho da Rua Augusta,ao lado do Bolonha, que um dia foi um colégio, que um dia virou pó, que virou estacionamento, que agora esta virando um “edifício arto” – meus respeitos Adoniran – me reconduz à lembrança aquele amor imperfeito, mas que plantou em mim um amor mais que perfeito pelos versos e reversos que a vida escreve.

Sonhos intensos vivi naquela calçada, por lá passo sempre e em todas as vezes uma pequenina e marota lágrima rola silenciosamente e faço com carinho, amor e saudade a mesma saudação: “Que os deuses do Olimpo, velem por teu sonho, amigo

terça-feira, 17 de junho de 2008

LORD JIM
(Uma modesta homenagem a todas aquelas que sempre serão namoradas, não importa o tempo nem o lugar )

Havia um hospital Matarazzo na região da Av Paulista e foi lá que ela deu seu primeiro sopro de vida neste planeta. Até os 9 anos seu róseo e suave mundo concentrou-se na região sudoeste da cidade, mais precisamente num sobrado simples incrustado em pequena vila, na rua Groenlândia, antiga
Entre bonecas e fantasias seu mundo se ampliava. Primeiro trilhou seu Caminho Suave, do A da abelha até a velha e boa Zabumba tanto no trajeto como na cartilha, aprendendo suas primeiras letras no Caetano de Campos, na central Praça da Republica. Na vila, a frondosa jabuticabeira oferecia seus saborosos frutos e galhos onde ela se dependurava e se imaginava a rainha do mundo. Aulas de piano, o mi sol si re fá semanal, com D. Regina, professora exigente e atenciosa. De vez em quando um passeio ao centro da cidade, um chá no quinto andar da Casa Anglo Americana, o conhecido Mappin, onde sua mãe talvez sonhando com o Teatro Municipal em frente e sua filha encantando todos com seu suave e intenso piano, ou um matinê no Cine Paulista, na esquina da Augusta com Oscar Freire e daí uma esticada e um lanche no Frevinho. Uma das esquinas mais famosas da cidade, não a cantada pelo poeta, mas a da Rua da Consolação com a Av Paulista, em frente ao cine Trianon, onde hoje é Belas Artes abrigava o ganha pão da família com o Posto Esso de primeira linha que seu pai possuía e que diariamente se fazia presente, administrando os negócios e lutando pelo bem estar da família . Um dia, um moleque de cabelos rebeldes e sardas chegou na sua vida e nela para sempre se incorporou. Brincadeiras de pegador na vila e na rua Taufic, algumas rusgas, um peteleco aqui, uma briga com a Helinha, com a Nair, com a Arlete, com a Nancy, um dia de ficar de mal ali, mas sempre os final das contas os dois juntos. No final da década de 50 porém, um trator passou pela sua vida. Alargou-se a Rua da Consolação que passou a ser Avenida, perdeu-se o posto, o ganha pão se fora, a família desmoronara, a mãe querida desaparecera. Necessidade de buscar novos rumos. Não há mais chás no Mappin, nem audições no Teatro Municipal, o que era sonho de crescimento ficou ponto de sobrevivência. E eu, misero e modesto coadjuvante, apenas observando a historia. Mudanças radicais. Nesse meio tempo o Hospital das Clinicas fez parte dessa vida. Nele uma doença difícil acompanhou sua mudança de menina, a moça, a mulher. Equipes médicas capitaneadas pelo Dr. Marcelo se desdobram, pesquisam, operam, um enxerto aqui, um colete de gesso e o milagre se fez e eu a vejo, moleca, andando de patins com o colete de gesso, ansiando a nova vida, sempre o mesmo sorriso, como se o infortúnio não fosse com ela. Sua residência agora á a Rua João Serrano, sem luz na rua, no Bairro do Limão, no fim da Celestino Bourruol e no comecinho da Dep Emilio Carlos. Não há mais o Caetano de Campos, agora é no Instituto Padre Moye onde ela se junta à Cleide e à Izilda e depois completa os estudos no Colégio Manoel de Nóbrega, na Casa Verde, que era conhecido como Matão. Saira da região Sudoeste para viver algum tempo na Região Noroeste da cidade. E eu, misero e modesto coadjuvante, apenas sofrendo à distância. Mas dentro das certas linhas que Deus escreve, um dia se deu o retorno. O sobrado da Rua Groenlândia tornou-se novamente iluminado e voltamos a nos ver. O primeiro e inocente passeio,( meio escondido ) ida e volta de trolebus, foi ao Cine Maracha, um cinema da Rua Augusta, hoje ocupado por uma faculdade onde assistimos Peter O´Toole no papel de Lord Jim, filme que por ter sido o primeiro é um marco de nossa união. Cessou, tudo o que a antiga musa cantou, e nosso sonho mais uma vez se faz presente. Duas crianças brincando de querer bem na ingenuidade dos anos 60, alimentando sonhos novamente nas floridas e arborizadas ruas do Jardim América, do Jardim Europa. Até que naquela tarde noite, naquela antevéspera de natal, na Igreja São José do Jardim Europa ela pronunciou o mais sublime, suave, sincero e esperado sim que eu ouvi na vida e fomos ambos, para nosso modesto sobrado na Vila Olímpia, na Al Raja Gabaglia. E eu, um misero e modesto coadjuvante passei a ter as ruas de São Paulo, vistas e percorridas pelos olhos de minha namorada, sendo inteiramente minhas, completamente minhas também. No final de tudo, resta apenas, uma pergunta : Será que eu mereço tanto ?

terça-feira, 13 de maio de 2008

PROCURANDO EMPREGO NOVO

Troco um sistema Excel por Word oficial. Se há um desequilíbrio na troca, junto três ternos muito utilizados, sendo dois feitos por alfaiates e um comprado nas lojas Garbo. Incluo todas as minhas gravatas, sendo uma italiana e outra que ganhei de presente da Inglaterra. Não quero mais saber de performances. Quero ampliar meus horizontes, deixo de lado 10 caracteres numéricos e assumo as 26 letras, inclusive as três importadas. Aproveito agora que o dólar está baixo. Quem quiser este pacote leva ainda minha HP 12-c meio baleada com a tecla “9” não registrando bem e a capa toda desbotada, mas ela ainda funciona, a HP e não a capa e tem proteção original, a capa, não a HP. Não quero mais sonhar com lucros financeiros, mas sim lucrar com sonhos generosos Se preciso vou mexer na terra e se criar bolhas nas mãos a Silvia Regina vai curar delas com o amor de sempre. Não quero mais saber da Bolsa de Valores nem dos poucos valores que quase nunca tenho no meu bolso; não quero mais pensar em taxas internas de retorno e sim retornar sem taxas e encargos ao meu interior. Quero ouvir um sambinha, no sentido carinhoso e não no pejorativo, ou então encher minha tarde de jazz, blues ou qualquer big band americana. Não importa se ouvir a Enia também, eu quero é esquecer de números e me afundar nas letras. Não quero mais calcular correções da poupança, nem saber de Planos Econômicos, aliás não quero saber de plano algum Troco uma assinatura do Valor Econômico, por uma coleção de livros antigos, só não pode ser do Harry Potler nem da Angélica. Dou de troco ainda toda a publicação estatística da Conjuntura Econômica, troco todos os suplementos de Economia do Estadão pelos suplementos do Caderno 2, desde que tenham Palavras cruzadas ainda para fazer. Vendo ou entrego pra sucata, se ninguém quiser comprar, todos os recibos pagos dos Conselhos Regionais que ( não ) usei durante esses trinta anos de ( dês ) atividades profissionais . Minhas trinta e tantas declarações anuais do Imposto de Renda podem ir para qualquer biblioteca que queira mostrar como trabalhar para os outros, ou dar para qualquer escola para crianças rabiscarem no verso, ou na frente, tanto faz como tanto fez. Estão todas processadas e liberadas, não obstante não estejam ainda todas pagas. Mas um bom advogado e a alegação que o possuidor é uma criança talvez se tenha um abatimento. Abatimento para a criança, pois para mim não tenho mais onde me abater. Vou montar um álbum com meus diplomas e currícula escolares . As fotos com amigos, aquelas de toda classe e o professor mais badalado. Vou instituir quem será figurinha carimbada, assinada ou as apenasmente simples ( o advérbio errado é proposital ). Com minhas agendas vou fazer uma grande fogueira, mas vou esperar uma data especial pois afinal é toda uma vida (dês) importante que está ali registrada e não seria justo nem honesto que uma fogueirinha qualquer num dia qualquer fosse o derradeiro leito da esfuziante e prospera vida profissional que ora se extingue. Quero deixar de ser financeiro para ser um escrevinhador Vou escrever pela manhã quando tiver fome ou logo depois do café da manha. Quero ver o besouro lutar para se desvirar, vou transferir o formigueiro para um lugar mais longe e onde eu não esqueça o pé em cima dele. Vou observar o passarinho fazer seu ninho e prepará-lo para a prole que logo chega; vou varrer todas as folhas do plátano e nem me preocupar em demarcar espaços, quantas recolhi ou quantas vassouradas dei. Quero conviver com o cobreado das suas folhas e não com o numero delas. Chega de números. Quero tomar um café bem quente na hora do café e só parar de conversar quando perceber que já e hora do almoço; quero dormir de tarde e acordar com o cheiro de bolo impregnado na casa, quero ouvir o ultimo causo do seu Dario, o faz tudo ( e o sabe tudo ) nas redondezas. Vou olhar um pouco mais para a Silvia Regina, cutucá-la quando estiver fervendo o leite e vê-la ficar amorosamente braba quando perceber que o leite se foi. Quero ter dificuldade para por o sapato e me enroscar com o nó da gravata quando tiver alguma solenidade na igreja e eu tiver que pedir uma emprestada( a gravata e não a igreja, é bom que fique bem claro). Quero chorar de emoção quando o neto pronunciar a primeira palavra e chorar sem emoção quando a pimenta que provar for mais forte que o produtor falou. Quero atender ao telefone e ouvir que foi engano; quero receber um convite do vizinho para ir pescar. E vou aceitar. Sei que vai ser um saco ir pescar, mas só pelo convite eu vou. E nem quero saber quantos peixes eu vou trazer, se é que vou pescar algum. Quero comprar um rádio mais potente só pra deixar de ouvir os evangélicos, um rádio que pegue apenas AM e FM, e importante, sem relógio e sem alarmes. Vou brigar com as abelhas que teimam em acabar com as frutas e vou empilhar sacos e sacos de frutas ( as que sobrarem das abelhas) para encher a geladeira dos meus filhos. Vou ter que ir, de vez em quando, para o Pronto Socorro sempre que eu me descuidar um pouco e as abelhas cheguem mais perto, muito mais perto. E finalmente, vou esperar o fim do meu dia chegar vendo os pássaros voando em formação por cima da minha casa; ver a cachorra correndo que nem louca atrás dos pássaros que passeiam pelo gramado e reclamar da vida quando esquecer de desligar a bomba do poço e a água estiver escoando pelo ladrão. Vou ajudar ativamente a fazer pão, gnocci ou molho de tomate. Nem que eu seja apenas o mestre trigueiro, que joga o trigo em cima da massa; aquele que abre as latas ou que arruma tudo o que não servir pro lixo. Ou aquele que varre a cozinha. Quero comprar uma guitarra, aprender a tocar e sair por ai, tocando blues. Pretendo ficar muito tempo nesse novo emprego, mas quando eu me for, que seja pela manhã e que dê pouco trabalho, que os amigos sejam chamados, se reúnam, se revejam, (mas que não fiquem fazendo piadinhas em cima de mim,) e que misturado com o murmúrio dos amigos se ouça Glenn Miller tocando Moonlight Serenade , bem baixinho Vou fazer tudo isso e um pouco mais, desde que não tenha mais números para enfileirar e ordenar. Troco meus três ternos e todas as gravatas e, ...puxa quase me esquecia. troco um sistema Excel por Word oficial.